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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Sinestesia: uma visão diferente do mundo

O canal de televisão SyFy transmite uma série relativamente recente chamada Alphas. Não é uma série de que goste propriamente. Tenho de dizer que não tenho nada contra as pessoas que a seguem, mas tenho algumas coisas contra algumas das premissas que usa. Para quem não conhece, resumidamente, a série segue um grupo de pessoas que têm habilidades especiais - quase como uma espécie de "super poderes". Um dos elementos consegue ver ondas electromagnéticas, o que lhe permite processar informação mais rápido que um computador, outro consegue ter força quase sobrehumana, outra consegue manipular as pessoas de forma a que estas façam exactamente aquilo que ela pede... enfim, dá para perceber a ideia.

Eu vi os primeiros três ou quatro episódios da série e acho que até podia ter tido algum potencial (digo podia ter tido, porque aparentemente foi cancelada) se não fosse uma das pessoas desse grupo ter o que chamam Sinestesia. Com esta habilidade ela consegue aumentar um dos sentidos quase exponencialmente reduzindo os outros todos drasticamente, o que lhe permite, por exemplo, lêr o título de um jornal a dez quarteirões de distância do sítio onde ela está.

Ora, a Sinestesia é de facto uma fenómeno neurológico que existe, sem bem que ninguém percebeu ainda exactamente como é que ela se processa.


Sinestesia vem do Grego e significa "união dos sentidos". Ou seja, o estímulo de um dos sentidos leva à experiência involuntária de outro.

Existem muitas formas de Sinestesia, sendo a mais comum a associação de cores a letras e números. No entanto podem chegar a coisas tão estranhas como a associação cheiros a personalidades. Para uma lista completa das formas de Sinestesia encontradas, fica aqui a mais completa.

Exemplo de associação de cores a letras e números.
O que me leva a escrever sobre isto, então? Perguntam vocês. (Para além do facto de estar a dar um dos episódios dos Alphas e eu me ter lembrado do tema...)
Todos nós vêmos, ou experienciamos, o mundo de forma diferente, embora cada um de nós pense que todos os outros vêm as coisas da mesma forma que nós. O facto é que isso não é verdade.

A primeira vez que me apercebi disso estava no nono ano, quando numa das nossas aulas de Matemática tivémos de preencher um questionário para o Ministério da Educação (se não era para o Ministério era para um sítio parecido) cuja última pergunta era: "Se a tivesses de atribuir uma cor à disciplina de matemática, qual é que seria?". Para mim a resposta era bastante óbvia, e assim que lá cheguei lembro-me de escrever prontamente, "Para mim a matemática é vermelha porque o M é vermelho e a palavra toma a cor da primeira letra.".

Claro está que quando saímos todos para o intervalo, cheia de curiosidade face ao que é que os meus amigos tinham respondido, fiquei bastante desiludida e confusa quando a maioria das respostas foram "verde porque eu sou do Benfica" ou a contrária "encarnado porque eu sou do Sporting". E claro está, ninguém gostava de matemática.

Desde então que tenho freneticamente pesquisado na internet sobre o assunto, mas só há coisa de uns dois anos é que ele se tornou mais popular, e acabei por descobrir o nome do que se passava: Sinestesia.

Embora para mim, o mais óbvio fosse a associação de cores e personalidades a letras e números, acabei por descobrir que tenho mais formas, que incluem por exemplo a associação de cores e movimentos a músicas e a forma como vejo os números ou o calendário na minha cabeça.

De certa forma, é como se tivesse uma espécie de habilidade especial - e não, não consigo ler a primeira página de um jornal com dez quarteirões de distância - mas também acaba por ter algumas desvantagens, embora poucas.

É graças à Sinestesia que ainda hoje sei as ligações das bases do ADN: Adenina - Timina e Guanina - Citosina, ou seja, amarelo com azul, e rosa com laranja. É também graças a ela que consigo rapidamente encontrar padrões numa sequência de símbolos ou palavras numa página, ou mesmo lembrar-me de nomes ou datas de acontecimentos distantes.

Esquerda: forma como alguém sem Sinestesia vê um conjunto de números 5 e 2.
Direita: os mesmos números vistos por alguém com Sinestesia.
Embora haja muito poucas desvantagens, noto por exemplo que ler um livro de matemática onde a maioria das funções são representadas pela letra r me provoca uma ligeira dor de cabeça, uma vez que as páginas se tornam basicamente laranja vivo.

Note-se ainda que cada pessoa atribui cores diferentes ao alfabeto, sendo esse um motivo de discórdia entre pessoas com Sinestesia.

Não se sabe ao certo as causas deste fenómeno, no entanto calcula-se que seja a forma como o nosso cérebro está ligado. Há pessoas que têm ligações entre partes responsáveis pelos sentidos que a maioria das pessoas não tem. No entanto há quem diga que em crianças todos temos Sinestesia e que esta se vai perdendo ao longo do tempo, enquanto que há pessoas em que isso não acontece.

Claramente o cérebro humano é um dos órgãos que menos conhecemos, e que precisamos de estudar muito ainda, mas é bom saber que dos fenómenos neurológicos existentes, há alguns que nos tornam a vida mais fácil, mesmo que seja só a tão poucas pessoas como 3.7% da população mundial.


Alguns links para mais informação:

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